Recentes modelos genéticos propiciam grande progresso na tarefa de explicar o papel dos Genes nas doenças mentais, criando novos paradigmas. Os genes não contêm as causas diretas para a eclosão das doenças, mas sim as anormalidades moleculares subjacentes que geram riscos para tal. Genes defeituosos podem “distorcer” a circuitaria neuronal no sentido de um processamento deficiente de informações, possibilitando o surgimento de sintomas sob certas circunstâncias ambientais. Os processos biológicos não são determinados exclusivamente pela genética, nem a função precípua dos genes é a transmissão imutável de características de uma geração a outra. Não se trata de um sistema estanque cuja expressividade e penetrância sejam inflexíveis. Os genes são os moldes para sua própria replicação e determinam, em parte, o fenótipo através da transcrição genética. A “tarefa” biológica é prover as sucessivas gerações de cópias fiéis do patrimônio genético da espécie. A fidelidade da replicação só pode ser quebrada por mutações aleatórias, estando, portanto, fora da influência ambiental. Embora todas as células de um mesmo organismo contenham todo o acervo genético disponível, apenas uma pequena parte dos genes se expressa. Genes codificam a síntese de proteínas, sendo que anormalidades moleculares podem resultar de proteínas geneticamente alteradas. A função transcricional de um gene, que redunda na sua capacidade de sintetizar proteínas é passível de regulação e responsiva a fatores ambientais. Através da chamada “Regulação Epigenética”, diversos fatores como hormônios, toxinas, estresse, aprendizado e interação socioambiental podem modificar a transcrição e, portanto, a expressão gênica. Isto inclui proteínas que regulam o neurodesenvolvimento, englobando neurogênese, seleção e migração neuronal, sinaptogênese, neuroplasticidade, movimentação axonal e dendrítica, formação de enzimas, transportadores, canais iônicos, mensageiros e muitos outros produtos gênicos. Um gene único não determina um comportamento, mas o fazem vários circuitos neurais, envolvendo milhares de neurônios, cada um dos quais expressando genes específicos direcionados à síntese de determinadas proteínas. Não há doença mental que possa ser predisposta por um único gene, mas sim por múltiplas pequenas contribuições de diversos genes, interagindo com estressores ambientais. Pode haver um conjunto de fatores de risco que predisponham o indivíduo para a doença, sem, no entanto, ser sua causa inevitável. Pode haver um conjunto de fatores de risco que predisponham o indivíduo para a doença, sem, no entanto, ser sua causa inevitável. Pessoas herdam riscos, predisposições, não doenças, havendo inúmeras maneiras de combinar suficiente risco com suficiente oportunidade no ambiente para que a predisposição se expresse através da doença.
O caminho hipotético que vai do gene à doença mental, atravessa o chamado endofenótipo biológico (moléculas, circuitos, processamento de informações, etc.), o endofenótipo sintomático (um sintoma isolado) até o completo cortejo sintomático que constitui a síndrome. A doença, enquanto fenótipo resultará da soma da expressão de múltiplos endofenótipos anormais. Os genes estão intimamente ligados às anormalidades moleculares que codificam, parcialmente ligados aos endofenótipos biológicos e mais remotamente ligados ao conjunto de sintomas relacionados a estes endofenótipos. A codificação de proteínas anormais propicia endofenótipos anormais que só vão ter expressão clínica se não forem contidos por sistemas compensatórios de “back-up” protetores contra a sobrecarga dos circuitos neurais. A vida pressupõe um “jogo de forças”. De um lado o genoma. Do outro os estressores ambientais. Quanto mais saudável o genótipo, mais capacidade terá o organismo de suportar os impactos causados pelos estressores. Ou seja, um equipamento genético forte resiste aos estressores mais poderosos, enquanto um genoma mais debilitado torna o indivíduo suscetível à doença mesmo na presença de estressores fracos. O genótipo saudável reage bem aos fatores estressores ambientais ativando circuitos adaptativos, mantendo normal o fenótipo. Indivíduos com genes de risco para doenças mentais podem reagir de forma diferente. Porém, é necessário que haja uma complexa combinação entre fragilidades genotípicas e poderosos estressores ambientais para que o fenótipo anormal se manifeste clinicamente. A personalidade e o temperamento também são determinados pelo equilíbrio de forças genéticas e ambientais. Funcionam como amplificadores ou mitigadores do stress. Podem filtrar circunstâncias adversas com respostas adaptativas e saudáveis ou com a ruptura do sistema. Algumas patologias são mais fortemente determinadas por via biológica que outras. A esquizofrenia é um exemplo. Isto significa que fracos estressores ambientais são suficientes para que o fenótipo anormal se manifeste. Já na depressão, estressores mais fortes têm que estar atuando. No transtorno de stress pós-traumático, a determinação biológica é bem menor. Portanto, é mandatório que experiências ambientais extremamente sobrecarregantes ocorram para haver a irrupção sintomática. Os gêmeos univitelinos, que possuem o mesmo genoma, devem creditar suas similitudes à genética e suas diferenças ao ambiente.