O que pensam os médicos brasileiros sobre o Suicídio Assistido?

Resumo Resumen Abstract Objetivo principal: Aquilatar a opinião dos médicos brasileiros sobre o suicídio assistido. Metodologia: Revisão Integrativa da Literatura (bases de dados e manual) a partir de estudos publicados em revistas científicas nacionais e internacionais nos idiomas inglês, espanhol e português desde 2009. Resultados gerais: Foram obtidos, a partir das bases de dados, após refinamento eletrônico da pesquisa, 519 estudos que, submetidos aos critérios de exclusão, resultaram em 37, abrangendo artigos acadêmicos de Jornais e Revistas especializadas e 1 Tese de Doutorado. Os estudos selecionados têm desenhos variados, incluindo revisões sistemáticas, integrativas, quantitativos, longitudinais, retrospectivos. A maioria provém da área de Ciências Jurídicas em detrimento das ciências da Saúde. Foi constatada baixíssima produção brasileira sobre o assunto. Todas as publicações referiam-se a adultos, com exceção de uma que abordava crianças. Conclusão: Resultou eliciado que o assunto em tela ainda é um “tabu” para os médicos, enfermeiros e psicólogos no Brasil, face ao pífio número de publicações de autores brasileiros ligados à Saúde, assim como em revistas brasileiras, contra uma frequência muito maior no cenário internacional. Esta conjuminação de fatores indica fortemente a necessidade imperiosa de combater o estigma existente e que a Bioética possa contribuir para o alargamento das pesquisas e do debate dos quais o país tanto carece nos tempos hodiernos. Palavras-chave: Suicídio assistido, Morte Assistida, Ética e Morte, Brasil, Brasileiros, Português, Assisted Suicide, Good Death. ¿QUÉ PIENSAN LOS MÉDICOS BRASILEÑOS RESPECTO AL SUICIDIO ASISTIDO? Objetivo principal: Valorar la opinión de los médicos brasileños sobre el suicidio asistido. Metodología: la revisión Integrativa de la literatura (bases de datos y manual) a partir de estudios publicados en revistas científicas nacionales e internacionales en los idiomas inglés, portugués y español desde el año 2009. Resultados principales: Se encontraron 37 artículos, predominando los artículos académicos de periódicos y revistas especializadas y un tesis de Doctorado. Los estudios seleccionados han cambiado los diseños, incluyendo las revisiones sistemáticas, integrativas, cuantitativos, longitudinales y retrospectivos. La mayor parte viene del área de ciencias jurídicas al detrimento de las ciencias de la salud. Fue verificado una cantidad pequeña de artículos médicos brasileños sobre el tema. Conclusión: Resultó eliciado que el tema todavía es un “tabú” para los médicos, enfermeros y psicólogos en Brasil por el pífio número de publicaciones de autores brasileños en el ámbito de la salud, del mismo modo en las revistas brasileñas, en contra una frecuencia mucho más grande en el escenario internacional. Esta conjunción de factores indica fuertemente la necesidad imperiosa de combatir el estigma que existe respecto al tema y que la Bioética pueda contribuir para el agrandamiento de las pesquisas e debates de los cuales el país tanto carece en los tiempos hodiernos. Palabras Clave: Suicidio asistido, Muerte asistida, ética y muerte, Brasil, brasileños, portugués, buena muerte. WHAT DO BRAZILIAN DOCTORS THINK ABOUT ASSISTED SUICIDE? Main objective: To assess the opinion of Brazilian doctors on assisted suicide. Methodology: Comprehensive Review of the Literature (databases and manual) from studies published in national and international scientific journals in English, Spanish and Portuguese since 2009. Overall results: 519 studies were obtained from the databases after electronic refinement of the research, which, subjected to the exclusion criteria, resulted in 37, covering academic articles from specialized journals and Magazines and 1 Doctoral Thesis. The selected studies have varied designs, including systematic, integrative, quantitative, longitudinal, retrospective reviews. The majority comes from the area of Legal Sciences rather than Health sciences. It was verified very low Brazilian production on the subject. All publications were related to adults, with the exception of one dealing with children. Conclusion: It was elicited that the matter in question is still a “taboo” for doctors, nurses and psychologists in Brazil, due to the insignificant number of Brazilian authors related to Health, as well as in Brazilian journals, against a much higher frequency in the international scenario. This combination of factors strongly indicates the urgent need to combat the existing stigma on the subject and that Bioethics can contribute to broadening the research and debate that the country needs in modern times. Keywords: Assisted suicide, Assisted Death, Ethics and Death, Brazil, Brazilian, Portuguese, Assisted Suicide, Good Death. Introdução Já foram publicados alguns estudos sobre a eutanásia e o suicídio assistido. Não há como perceber um denominador comum entre eles, face às diferenças metodológicas, linguísticas e de ambientação socio cultural. No Brasil os dados são muito escassos 37. Eutanásia: A etimologia do vocábulo é proveniente do grego “eu” + “thanatos/thanasia”. Significa “boa morte”. Consiste em abreviar a vida de um doente incurável, tendo por finalidade precípua evitar o sofrimento. Sua prática remonta a tempos imemoriais. Platão, Sócrates e Epicuro a defendiam enquanto Aristóteles, Pitágoras e Hipócrates a condenavam. Na Europa cristã foi definitivamente condenada posto que a vida e a morte são compreendidas como prerrogativas Divinas. O termo “eutanásia” foi cunhado formalmente no século XVII, por Francis Bacon, em seu “Tratado da Vida e da Morte”. Continua suscitando fervorosas querelas. Nos países em que foi regulamentada, Holanda, Bélgica e alguns Estados americanos, argumenta-se que viver é um direito e não uma obrigação, ensejando evitar o sofrimento insuportável. Nos países onde é ilícita, como Itália, Espanha, França, Alemanha e outros, a vida é um bem jurídico inviolável, indisponível e intangível. A Eutanásia no Direito Brasileiro: Enquadra-se no crime de homicídio doloso, artigo 121 do Código Penal. A pena de reclusão varia de seis a vinte anos. Suicídio Assistido: Frequentemente é confundido com a eutanásia. A demanda é a mesma, porém a morte é auto-inflingida. Na eutanásia a morte advém diretamente da ação de outrem. Contrariamente, o suicídio assistido é atitude do próprio paciente, sob assistência médica. O Suicídio Assistido no Direito Brasileiro: É illegal. Quem o executar estará incurso no artigo 122 do Código Penal, sob pena de reclusão. Dois a seis anos, se o suicídio se consuma. Um a três anos, se a tentativa de suicídio resulta em lesão corporal. Distanásia: Obstinação Terapêutica é a sinonímia, sem perspectivas, procrastinação do desfecho a qualquer custo. Ortotanásia: “Orthos” + “thanatos”. Significa “a morte correta”, natural no tempo e modo. Pressupõe que não sejam empenhados desnecessários esforços para o prolongamento da agonia. A Ortotanásia no Direito Brasileiro: Não há lei específica, porém está respaldada nas resoluções do Conselho Federal de Medicina 1806/2006, 1931/2010 e 1995/2012 que a “autorizam”. Testamento Vital: “O Testamento Vital é um documento escrito no qual uma pessoa dispõe acerca da sua vontade quanto aos cuidados médicos que pretende receber quando perca a capacidade de exprimir seus desejos, ou se encontrar em estado de incapacidade que não possa decidir por si”, segundo Vera Lucia Raposo, renomada jurista portuguesa. No Brasil não há legislação específica que regulamente o Testamento Vital isto porque o ordenamento jurídico pátrio considera a vida um bem indisponível28. “Torna-se fundamental promover o consenso possível sobre esta temática e, para tanto, a realização de uma Conferência Nacional de Consenso sobre a Suspensão ou Abstenção de Tratamento em Doentes Terminais, envolvendo tanto especialistas como a sociedade civil, parece ser um excelente instrumento para propiciar a generalização de “guidelines” sobre a temática da ortotanásia, tanto em Portugal quanto no Brasil”, segundo o Prof. Dr. Rui Nunes, igualmente renomado Bioeticista português23. Metodologia Pergunta de investigação: “Qual é o conteúdo dos trabalhos de investigação em revistas científicas, a partir de 2009 no que diz respeito ao que pensam os médicos brasileiros sobre o Suicídio Assistido?” Critérios de seleção: Foram incluídos todos os estudos realizados no âmbito da Bioética, da Medicina e Jurídico, publicados em revistas científicas desde 2009, nos idiomas português, espanhol e inglês. Excluídas as revisões narrativas, os artigos de reflexão, os editoriais e as apresentações feitas em congressos ou conferências. Estratégias de busca: A investigação foi desenvolvida de forma independente pelo autor. Repousou nas bases de dados eletrônicas PubMed, Google Acadêmico, Cochrane Library, Lillacs, Scielo e Portal Regional da BVS. Utilizados os termos de busca: “suicídio assistido, ética e morte, morte assistida, assisted suicide, good death, Brazil, brasileiros, português”. A busca eletrônica obedeceu a sequência (suicídio assistido OR assisted suicide OR morte assistida OR good death) AND (Brazil OR portuguese OR português OR brasileiro). Consultadas todas as referências bibliográficas dos artigos selecionados. A versão integral obtida, quando necessário. Seleção dos estudos: Os trabalhos foram analisados através de seus títulos, resumo e leitura integral. Os artigos foram inseridos numa base de dados pertinente ao programa EndNote X8, sendo classificados como relevantes, potencialmente relevantes ou irrelevantes. Foram considerados irrelevantes os duplicados ou que não cumpriam os critérios de elegibilidade, potencialmente relevantes os artigos cuja leitura do título ou resumo não foi elucidativa motivando uma leitura minuciosa e relevantes os artigos que cumpriam em sua totalidade os critérios de seleção. No total foram encontrados 519 artigos. Não foi encontrada nenhuma Revisão Sistemática em contexto brasileiro na Cochrane Library. Para esta revisão foram destacados 37 artigos. A figura 1 apresenta, de forma esquemática, o processo de escolha. Figura 1: Estratégia de depuração Autor (Ano de Publicação) Revista Bascuñán (2016) (1) Revista médica de Chile Bomtempo (2013) (2) Revista Síntese Direito de Família, São Paulo Bonamigo e de Oliveira e Scalabin e dos Santos e Rebelatto (2015)(3) Anais de Medicina Burlá, e Parsons e Nunes (2015) (4) A aplicação das diretivas antecipadas de vontade na pessoa com demência Castro e Antunes e Marcone e Andrade e Rückl e Andrade (2016) (5) Revista Bioética Concone (2014) (6) Kairós Gerontologia. Revista da Faculdade de Ciências Humanas e Saúde. ISSN 2176-901X Cruz e Oliveira (2013) (7) Revista Bioética Oliveira (2012) (8) Artigo de jornal Dos Santos (2015) (9) Artigo de jornal Epaminondas (2014) (10) Artigo de jornal Félix e da Costa e de Melo Alves e Duarte e Costa e de Brito (2013) (11) Revista Ciência & Saúde Coletiva Ferreira (2016) (12) Artigo de jornal Guimarães e de Carvalho e Simões e Lima (2016) (13) Revista Enfermagem UERJ Horta (2009) (14) Revista Bioética Kovác, (2014) (15) Revista Bioética Kravetz e Castro (2016) (16) Revista Jurídica Martinez e Bersot (2015 (17) Revista Argumenta Martins Rocha (2013 (18) Revista Bioética Martins e Nunes (2015) (19) Revista Bioética Medeiros (2014) (20) ComCiência Miranda (2012) (21) Revista médica de Chi Monteiro da Cruz e Ayer Oliveira (2013) (22) Revista Bioética Nunes (2009) (23) Revista Bioética Parreiras e Cafure e Pacelli e Silva Andrade e Ruckl e Angelo Andrade (2016) (24) Revista Bioética Pienaar (2016) (25) South African Journal of Psychiatry Redbruch (2016) (26) Palliative Medicine Reis (2016) (27) Revista eletrônica Rocha (2014) (28) Jus Humanum: Revista Eletrônica de Ciências Jurídicas e Sociais Santos (2016) (29) Artigo eletrônico Santos (2011) (30) Tese de doutorado Schramm (2012) (31) Rev Bras Cancerol Siqueira e Schramm (2013) (32) Ciência & Saúde Coletiva Steck, e Egger e Maessen e Reisch e Zwahlen (2013) (33) Medical Care Taboada (2012) (34) Acta Bioethica Taboada (2014) (35) Acta Bioethic Tomasini (2014) (36) Acta Bioetica Urban (2014) (37) Studia Bioethica Extração, síntese e análise dos dados: Relativos à autoria do trabalho, revista, ano de publicação, desenho do estudo, participantes, contexto/local, temática e produzidos no âmbito da Bioética, Medicina e Jurídico. Os dados foram introduzidos na base de dados, realizados os cálculos estatísticos descritivos e analisado o conteúdo. Os dados foram introduzidos na base de dados, realizados os cálculos estatísticos descritivos e analisado o conteúdo. Resultados Os artigos selecionados constam da tabela 1 e serão apresentados e discutidos a seguir. Ano de Publicação: O primeiro artigo selecionado foi publicado em 2009. O número de publicações aumentou gradativamente, sendo que em 2014 verificou-se um aumento significativo (n=8). O ano que apresenta o maior número de artigos publicados foi 2016 (n=10) sendo mais frequente no cenário internacional. Revista: Os 37 artigos selecionados foram publicados em 20 revistas. Destes, 16 foram publicados em revistas brasileiras. Dos 37 apenas 1 é psiquiátrico. Constatou-se, entre os selecionados, razoável produção brasileira sobre o assunto (43,25%). A despeito do maior número de artigos terem sido extraídos da Revista Bioética (n=9), a grande maioria provém de revistas da área de Direito. No que diz respeito ao idioma, constatou-se que 25 eram em português, sendo que desses, 21 eram bilíngues (inglês/português), 5 eram em espanhol e 7 somente em inglês, idioma de referência na comunidade científica. Não foi observada nenhuma relação entre o fator de impacto e o número de artigos. Dezoito artigos foram publicados em revistas que não apresentam fator de impacto até o momento mas que gozam de alguma credibilidade na comunidade acadêmica. Participantes e contexto do estudo: Os estudos foram desenvolvidos considerando o direito do paciente terminal ou com patologias graves e irreversíveis de optar pela morte digna. basicamente foram encontrados 53% de artigos jurídicos, 38% relacionados à Bioética e apenas 9% à medicina. Apenas uma referencia ao suicídio assistido em crianças. Desenho do Estudo: Os estudos selecionados são de desenhos variados incluindo revisões sistemáticas e integrativas, estudos quantitativos, longitudinais e retrospectivos. Temas n Suicídio assistido no Brasil e no mundo 10 Bioética e profissionais de saúde 9 Eutanásia e outras definições 6 Preceitos éticos e decisões 4 Morte com autonomia 3 Morte digna e o direito de escolha 2 Finitude e morte 1 Leis Brasileiras / CFM 1 Licitude Civil 1 Temáticas estudadas: Resumidas na Tabela 2. Discussão No Brasil, cuidados médicos no final da vida são dispendiosos. As UTI estão ocupadas por idosos padecentes de doenças crônicas irreversíveis por longo tempo, sob tratamentos invasivos e onerosos, que poderiam ser melhor atendidos em programas de cuidados paliativos. Neste país, optou-se pelas diretivas antecipadas de vontade (DAV), amparadas pelas resoluções do CFM, reconhecendo o direito do paciente de manifestar sua vontade sobre tratamentos médicos e designar representante para tal fim, além da obrigação médica de cumpri-la15. Concluiu-se, enfim, que não há como responsabilizar civilmente o médico que Tabela 2. Temas estudados (n=37) pratica a ortotanásia, pois o seu próprio conceito se opõe à conformação dos elementos da responsabilidade civil7. Por seu turno, o suicídio assistido situa-se entre a eutanásia e a ortotanásia, pois sua realização depende do auxílio médico. Entretanto, quem o requer e tira a própria vida é o paciente terminal. Logo, o suicídio assistido ocorre quando, por decisão consciente em face de doença terminal, cuja deterioração resulta em intenso e desnecessário sofrimento, o paciente opta pela morte assistida. “O ato causador da morte é de autoria daquele que extermina a própria vida.” Atualmente, o suicídio assistido é autorizado na Bélgica, Suíça, Holanda, cinco estados dos EUA (Oregon, Washington, Montana, Vermont e Novo México) e na Colômbia. Outros países debatem a possibilidade de legalização. Os países que aceitam este direito o limitam a pacientes terminais, cujo progresso da enfermidade cause sofrimento degradante, cruel e indigno17. A expressão “morte assistida” engloba tanto o conceito de eutanásia quanto o de suicídio assistido, ambos temas de fervorosos debates. É permitida em quatro países da Europa Ocidental (Holanda, Bélgica, Luxemburgo e Suíça), em dois países norte-americanos (Canadá e Estados Unidos) e um na América do Sul (Colombia)5. A aprovação belga da eutanásia para menores de idade, reacendeu o debate. A criança, por sua condição de vulnerável, apresenta desafios éticos mais complexos. Deve ficar cabalmente eliciado que a eutanásia infantil não escamoteia a eutanasia involuntária19. A regulamentação do suicídio assistido deve ser prioridade nas discussões jurídicas do século XXI, uma vez que a criminalização do suicídio assistido nega ao enfermo a prevalência da dignidade e sua autonomia para finalizar o sofrimento, imputando ao padecente uma vida penosa consubstanciada em verdadeira tortura27. Considerações Finais e Conclusões O suicídio assistido poderia ser categorizado à guisa de ortotanásia, visto que é o paciente quem decide pelo final da própria vida, contando com o auxílio médico, desde que seja portador de uma doença terminal e esteja sob intenso sofrimento, degradante e cruel. O Código Penal brasileiro penaliza esse tipo de morte piedosa, mas a admissão da antecipação da morte, por meio do suicídio assistido, seria uma forma de valorizar a dignidade humana e fomentar, com a descriminalização do instituto, políticas públicas para a efetividade do princípio da autonomia no final da vida17. O Brasil necessita sobremaneira avançar nessas questões da Bioética e do Biodireito. O presente trabalho tenciona mostrar a necessidade imperiosa de ampliar o espectro dos estudos sobre o assunto. Faz-se mister, ainda, modernizar o ordenamento jurídico do país, permitindo normatização mais flexivel a respeito do problema.

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